Lâmina
Enquanto uma criança puder cantar
haverá esperança. Os labirintos serão extintos
e o sussurrar do vento revelará portais que se julgava
adormecidos para o dia irreproduzível,
insuportavelmente iluminado e febril
que percorre perene a vastidão desta montanha
onde os deuses sorriem perto
e os maladarins dançam flores.
Ele surge do visor de seu elmo
esquadrinhando meus sonhos de improviso
como se fossem métodos de costura
cerzindo a vida de forma racional e estática
em sua armadura que deveria ser de seda
com motivos de colibris na primavera dos setembros
ultrapassando em meteoros mundos do avesso para o direito
sem lógica de vieses ou tramas mal contadas
que lhes desse qualquer plano de voo ou de discórdia.
É agora que meus assobios em pétalas transformarão ferro em
brasas
nessa guerra de ilusões sem vencedores nem pilhagens
onde os espólios serão as máscaras do diabo
caindo sem sequer fazer alarde ou deixar sequelas.
Tudo será entregue, como o bumerangue de uma cruz órfã
sem condenados que a carreguem nem ressuscitados que ultrapassem
as divisas entre a liberdade e o sono recorrentes deste saque.
Há uma visão que não pertence à ordem dos jogos clarividentes
que os cegos conduzem do banco dos réus
pretendendo o juízo final dos que tem sede de justiça
mas que estão mancos de coragem para saquearem suas ruínas
e prevalecerem livres, isentos à brisa da cidade sitiada
e dos estandartes trêmulos de farrapos singrando tênues vitórias
sobre cadáveres esquecidos no valhala de seus medos.
É desse mesmo campo minado de sangue e ossos
que um jardim de tulipas vermelhas e lírios sublimes se erguerá
alerta
sublinhando o tempo e a vertigem de olhar através,
alterando as lentes e as lâminas em células e estrelas.