terça-feira, 11 de agosto de 2020

O Rugido Silencioso do Sol

 


O Rugido Silencioso do Sol


As bênçãos vêm todos os dias, em todas as vidas,

corpos de pura luz que não projetam sombras,

com o mistério e a fina ironia dos deuses

perseguindo nossas trilhas indefinidamente,

criando atalhos, abrindo becos e escancarando portas:

interminável arco-íris onde a unidade é plural.


A terra vermelha da Morada do Sol

continua tingindo meus caminhos e apagando pistas

para que quando a encontre de novo

a surpresa seja tão original e tenra

quanto da primeira vez sem fronteiras

e algo permaneça intocável e sólido:

alicerces que nenhuma maresia corrói.


O cheiro de doce de laranja nos finais de tarde...

Araraquara passando trens em minha eternidade…


É esse farol que justifica meu percurso.

É sua inspiração que guia meus mitos,

constelações legítimas bordando crivos

nos riscos nevrálgicos de tanto destino exposto

à poeira, estrada, vento e tempestades

sem qualquer defesa ou referência,

entrega de céu íntimo onde estrelas têm vida inteligente

e se comunicam, indetectáveis para o mundo dos sentidos,

prevalecendo sobre qualquer definição ou códigos de linguagem

atingindo a nota certa da canção

ao cantar com um sorriso nos lábios do regato:

moendas processando o trigo cerzido do campo

pela música do arroio para o pão de luz diário.


A chuva virá, transbordando de mim mesmo

de forma tão clara que a própria escuridão não me achará!

Fruto cuja semente provou do magma ardente

do solo vulcânico, excelente para o cultivo dos vinhedos,

vida criada através das cinzas que se confundem

entre o húmus e as estrelas

enquanto outras vozes se insurgem no incêndio do silêncio

e o teatro de sombras cria sóis ao redor, 

sem prólogos ou epílogos,

puros reflexos do próprio cerne da canção

cujo presente não tem rimas ou melodia sequer,

apenas substância.