sábado, 12 de fevereiro de 2022

Canção para um novo inverno

 

Canção para um novo inverno


Enquanto o jugo puído pelo roto punho do mundo

impõe camisas de força

pagas em moedas de sangue e balões de oxigênio,

para assombro dos fantasmas

eu vivo e respiro da minha nudez interior,

completamente em paz com o inverno que se anuncia.


E tudo se congrega na mais absoluta resignação,

sem qualquer hierarquia. O inexplicável continua ambidestro

dialogando comigo tanto a direito quanto na contramão

na sucessão de incontáveis eventos

que somente a imparcialidade do retrovisor

pode entender e alcançar de braços abertos

alternando no mesmo cálice sua cruz e redenção.


Há muitas estações abandonei a segurança das vias pavimentadas

pela aventura sublime da mata fechada

abrindo atalhos para o interior da selva densa

contando apenas com a sabedoria inexorável das lâminas

e a exaustão completa de todos os relógios,


Assim, mesmo sem a permissão dos semáforos

ou sinalização demográfica

abracei definitivamente a maratona dos desertores

sem bússolas nem astrolábios,

somente o beijo úmido e cúmplice da floresta

atirado de viés pelo silêncio do indicador.


Raramente dedos em riste apontam para a liberdade.


Entre aborígenes e bumerangues

a verdade está na curva.

Não há linha reta ou diâmetro

entre deuses e homens.




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