Nada e a nossa condição
a João Guimarães Rosa
Não há sequer um poema por cometer...
A indolência das tardes de domingo
é passiva demais nos trópicos.
Não há lugar algum para ir, exceto aqui.
Há planos para uma viagem através:
mero subterfúgio para um tema.
Tropecei cáustico sobre emendas e estrofes
procurando calar com palavras meus apelos,
esbarrando em deuses e mandalas nas entrelinhas
para trazer à superfície a exaustão de todos os poemas,
a conclusão final de todos os meus medos
e um apêndice para a solução tardia dos meus desejos.
Tudo foi devidamente emprestado
como um crédito em forma de vida
dado pela tirania do destino,
sempre a postos como um cérbero
mordendo impiedosamente vezes três.
Inventei, portanto, pontes na neblina,
mapas para todos os precipícios
e escadas que me resgatassem em aeroplanos
sem metamorfoses de adeus.
E restou apenas um gosto amargo em forma de canção:
- Marcha soldado, cabeça de papel...
Mas ela ultrapassa em ser
qualquer rude poema
que não fale da alma.
A fome das águias também conhece as alturas.
Sempre à tona da alma com os poemas!
O verso é um brinquedo
e ele às vezes quer ser vão,
prefere falar às borboletas do quintal sem tecer enredos,
falar ao dragão das fábulas incendiadas
a ter de queimar suas próprias cinzas
na pira do sono e da cega clarividência
para renascer em seu voo de libertação.
Se não houver voos, farei meu itinerário a pé, descalço,
mais inconsequente que um Louco do Tarô.
A viagem também é como esse verso em forma de brinquedo.
Ambos são impermanentes,
Sonâmbulos interpretando o xadrez da realidade
num jogo perdido de antemão. Não há mistério.
O silêncio é a última porta.
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